Por Christine Salomão, jornalista – diretora de conteúdo da ebdi. Mastering Consumer Credit Trends 2023: “Reconstrução de um cenário de crédito ideal.”
O mais recente levantamento da Serasa, com dados de março de 2023, indica que a inadimplência no Brasil segue crescendo, mas com desaceleração. “O indicador de inadimplência aponta 70,71 milhões de brasileiros com o nome restrito”, cita Guilherme Leonardi, data science manager da Neon, ao abrir o ciclo de palestras do Mastering: Consumer Credit Trends 2023, que aconteceu de 24 a 26 de maio, no Resort Villa Di Mantova, em Águas de Lindóia, São Paulo, uma iniciativa ebdi.
E o grande vilão da inadimplência no Brasil, explica o executivo, “continua sendo o cartão de crédito que responde por 31,6% das dívidas, de acordo com a Serasa”. Seguido pelas contas básicas (21,7%) e pelo setor de varejo (11,2). O relatório montra, ainda, que “a faixa de renda mais atingida pela inadimplência é a de até 2 salários mínimos – 77,9% do total”, enfatiza o executivo.
Na avaliação de Leonardi, “a quantidade de CPFs inadimplentes e negativados subiram ao longo dos últimos anos em um ritmo muito mais acelerado do que o indicador de saldo, dando fortes indícios que a perda de crédito vem sendo em detrimento de saldos menores para clientes de menor renda.”
E a “expectativa da inadimplência é de continuar crescendo, em um ritmo menos acelerado, porém a evolução do mercado de crédito está muito mais dependente das estimativas que temos no cenário macroeconômico que são positivas”, explica o executivo.
Agora, vale ressaltar que o crédito desempenha um papel fundamental como potencializador do crescimento e da transformação digital do pequeno e médio varejista. E foi justamente para ajudar a sanar as dores desse público que nasceu o Compre Agora, explica Gian Gagliardo, head financeiro da empresa, ao apresentar o case de sucesso da plataforma, que nasceu dentro da Unilever e ganhou mercado pelo modelo de negócio inovador.
Inovador por oferecer uma gama de serviços, benefícios, conteúdo e um programa de fidelidade que faz com que o pequeno varejista possa alavancar seu negócio e prosperar no cenário digital e das grandes redes. Para Gagliardo, o segredo do sucesso está no fato de “termos um objetivo claro: ajudar o pequeno e médio varejo a prosperar.”
Além disso, acrescenta o executivo, é importante “estar próximo e conhecer as dores do seu cliente; ter velocidade na tomada de decisão (ajustar a rota sempre que necessário); e no caso de um marketplace, é preciso que todos vejam valor na plataforma.”
Consumer Credit Trends: “um novo mercado está surgindo”
Já Junior Santos, CEO da iDtrust, que também apresentou o case de sucesso da empresa, nos fez refletir sobre como “as tecnologias estão desempenhando um papel fundamental na alavancagem dos meios de pagamento e das fintechs, impulsionando a inovação e transformando a forma como as transações financeiras são realizadas.”
O executivo salientou ainda que “um novo mercado está surgindo. Mas será que estamos preparados para isso?. Como o user experience: produtos e serviços moldados por experiência e design focados no usuário”. Ou seja, são observadas todas as etapas do cliente junto à marca, desde o primeiro encontro até o consumo.
Junior Santos ao vislumbrar esse novo mercado cita também a nossa falta de preparo para: “as soluções ditadas por inovações e tendências, como blockchain e carteiras digitais; oportunidade: se aproveitam do sistema financeiro burocrático no país para entrar e crescer.”
Na palestra seguinte, Ricardo Ferreira, COO da Cinnecta, mostrou “como aprimorar a análise de risco com dados de perfil e comportamento do indivíduo”. O executivo explicou detalhadamente como as empresas, ao utilizar a plataforma de inteligência de dados da Cinnecta, podem identificar oportunidades dentro das suas bases de clientes, a partir de uma análise personalizada e escalável do comportamento de cada uma das pessoas.
Outro ponto alto do Encontro foi a palestra ministrada por Paulo Bissacot, CEO da Oppens, sobre: “Fraudes na era digital: antecipação e prevenção de ataques multicanais”. Afinal, com os avanços tecnológicos e a crescente interconectividade, os criminosos têm explorado múltiplos canais para realizar ataques sofisticados e prejudicar indivíduos, empresas e organizações.
Segundo o executivo, “pesquisa da Serasa revela que cerca de 62% dos brasileiros entrevistados têm alguma preocupação com a realização de atividades e transações online. E o que mais gera preocupação neles são: roubo de informações do cartão de crédito (78%); privacidade online (59%); e-mails mensagens ou golpes de telefone falsos / phishing (57%).”
Bissacot adverte também sobre os tipos de fraudes mais comuns hoje. Confira a seguir:
- Phishing;
- Clonagem de cartão
- Fraude em boletos bancários
- Roubo de identidade
- Golpes com cartão de crédito
- Skimming
- Malware
- Ransomwar
Quanto as soluções tecnológicas para prevenção à fraudes, Bissacot cita:
Autenticação multifator (MFA): a autenticação multifator adiciona uma camada extra de segurança ao exigir que o usuário forneça mais de uma forma de autenticação, como senha e reconhecimento facial ou de impressão digital.
Biometria comportamental: a biometria comportamental é uma técnica de autenticação que analisa o comportamento do usuário, como o ritmo da digitação, a forma de segurar o dispositivo, entre outros, para verificar sua identidade.
Inteligência artificial (IA): a IA pode ser usada para detectar padrões de comportamento suspeitos em transações financeiras e alertar os usuários sobre possíveis fraudes.
Análise de dados em tempo real: a análise de dados em tempo real permite a detecção de fraudes em tempo real, possibilitando uma resposta mais rápida e efetiva.
Blockchain: o blockchain é uma tecnologia de registro distribuído que pode ser usada para tornar as transações financeiras mais seguras e transparentes.
O executivo falou também sobre as iniciativas da Oppens na prevenção de fraudes:
- Segurança nos sistemas desde a concepção
- Monitoramento de transações suspeitas
- Validação digital de documentos
- On boarding digital com biometria: reconhecimento facial; prova de vida – Liveness
- Confirmação de posse de: e-mails e números de celulares
- Verificação de SIM Swap
- Iniciando testes com biometria de voz
Equilíbrio entre taxa de credito e taxa de inadimplência
No mundo corporativo, onde a diversidade de perfis da carteira de clientes é uma realidade para a maior parte das organizações, é crucial compreender e saber equilibrar a taxa de crédito e a taxa de inadimplência. Essa habilidade se revela como um fator essencial para o sucesso de qualquer empresa, mas certamente não é uma tarefa fácil. Principalmente porque a inadimplência no Brasil só cresce: são cerca de 70 milhões de pessoas com nomes restritos, de acordo com a Serasa, além de uma economia que não parece dar sinais de expansão no curto prazo. Foi o que sinalizaram Guilherme Erne, gerente de crédito e cobrança da Votorantin Cimentos e Thiago Miranda, gerente financeiro do Grupo Boticário ao abrirem o segundo dia do CC Trends 2023.
Segundo eles, “não existe uma resposta única e correta que se aplique a todas as empresas quando se trata de equilibrar a taxa de crédito e a taxa de inadimplência. As estratégias e abordagens podem variar dependendo do setor, do porte da empresa e de outros fatores específicos. Cada organização deve analisar sua própria situação e adaptar as práticas de crédito e cobrança de acordo com suas necessidades e características.”
No entanto, acrescentam os executivos, “existem algumas diretrizes gerais que podem ajudar a empresa a encontrar um equilíbrio saudável entre a concessão de crédito e a redução da inadimplência, principalmente devido aos benefícios dos avanços tecnológicos”. Isso porque as ferramentas podem ajudar na análise de dados, automação de tarefas, emissão de relatórios e acompanhamento das transações financeiras, permitindo uma visão mais abrangente e precisa da situação financeira da empresa.
Para Tatiana Mendonça, gerente de recuperação de crédito, “a jornada do cliente e a análise de dados desempenham papéis fundamentais na criação de produtos e definição de estratégias bem-sucedidas para as empresas, o que inclusive ajuda a identificar pontos críticos e tomar medidas proativas para evitar a inadimplência.”
A executiva que ministrou palestra no Encontro sobre “Avaliando o comportamento do cliente com base na jornada, para se proteger de futuros problemas”, contou suas experiências via cases de sucesso e nos fez refletir sobre a importância da análise de dados para extrair insights valiosos sobre o comportamento do cliente, tendências do mercado e padrões de compra.
Além disso, “a análise de dados também pode ser usada para identificar lacunas no mercado e oportunidades de criação de novos produtos ou serviços”, ressalta a executiva. Não é à toa que as empresas da chamada nova economia, como Uber e iFood por exemplo, cujo foco é atender às necessidades e desejos do ser humano, criaram modelos de negócios até então impensáveis jogando por terra os mais tradicionais.
Na sequência, o Encontro promoveu uma discussão aprofundada sobre o tema: “os desafios da cobrança: buscando o remédio certo para cada perfil de cliente inadimplente”. O painel, que foi comandado por Guilherme Leonardi da Neon, Rodrigo Massis da Multiplica e André Horta do Mercantil do Brasil, mostrou as dores da cobrança, principalmente pela falta de alternativas de ofertas que ajudem a abrir uma porta de negociação com os clientes.
Segundo os executivos, “o modelo apelativo de cobrança, que se baseia principalmente em ameaças de negativação do cliente inadimplente, tem perdido eficácia nos últimos tempos. Muitos clientes que estão em situação de dívida não se sentem tão preocupados em serem negativados, seja porque já estão negativados ou por considerarem a negativação um mal menor em comparação com outras dificuldades financeiras que enfrentam, principalmente se forem empresas de médio e grande portes.”
“Sem falar que atualmente existem alternativas de crédito disponíveis mesmo para clientes inadimplentes ou negativados”, acrescentam. E embora as opções possam ser limitadas em comparação com aqueles com histórico de crédito limpo, algumas instituições financeiras e empresas oferecem produtos específicos para atender a essa demanda.
Por isso, a mudança de comportamento por parte dos clientes inadimplentes requer, atualmente, uma abordagem diferente das empresas na gestão da cobrança. “Em vez de focar apenas na punição, é necessário entender a intenção de cada perfil e buscar estratégias mais efetivas que visem à recuperação do cliente e à manutenção do relacionamento. Afinal, quem está devendo, na maioria das vezes, não gostaria de estar naquela situação e precisa de ajuda para sanar suas dívidas”, enfatizam os executivos.
Consumer Credit Trends: Open Banking – “um passo inicial rumo a um sistema financeiro mais aberto”
Dando sequência ao Encontro, André Vieira, superintendente executivo de Analytics (CDO) do Banco Sofisa Direto, falou da importância do Open Banking, que representa um passo inicial rumo a um sistema financeiro mais aberto, conectado e orientado por dados.
Isso porque o Open Banking se concentra principalmente no compartilhamento seguro de dados financeiros dos clientes entre instituições financeiras, permitindo que os clientes tenham maior controle sobre suas informações e possam compartilhá-las com outras instituições de sua escolha. “Isso promove a concorrência e a inovação, além de oferecer aos clientes acesso a uma gama mais ampla de produtos e serviços financeiros”, sinaliza o executivo.
O executivo também abordou temas como “o uso do cadastro positivo de forma diferenciada, os benefícios e avanços da Inteligência Artificial com o ChatGPT, que em seu lançamento alcançou 1 milhão de usuários em 5 dias, além do uso da geolocalização na eficiência da concessão de crédito.”
Na palestra seguinte, Leandro de Pádua, gerente executivo de finanças do Grupo Martins, nos contou como a empresa, fundada em 1953, se tornou o maior atacado distribuidor marketplace do Brasil. O segredo do sucesso está no Sistema Martins, “que oferece soluções completas para o varejo brasileiro e se diferencia pelo modelo de crédito inovador, sendo que o coração do negócio é a logística”, afirma o executivo.
Novas tecnologias X inovação no mercado
“Faça o que fizer, faça bem. Faça tão bem que quando as pessoas virem você fazer isso, elas vão querer voltar e ver você fazer de novo, e elas vão querer trazer outras pessoas e mostrar-lhes como você faz o que faz.” A frase dita por Walt Disney foi citada porAlan Armstrong, sócio / head de parcerias da 3C Plus, e mostra a importância de se buscar a excelência na experiência no cliente. Tanto que a marca Disney é referência em inovação por “encantar clientes”.
Mas para ter sucesso no customer experience, as marcas precisam trabalhar melhor seus canais de comunicação. “77% dos brasileiros são influenciados pelas redes sociais para a tomada de decisão de compra, segundo pesquisa da PwC”, ressalta Armstrong. “E muitas empresas estão nas redes sociais apenas para marcar presença e não exploram o potencial desses canais para crescer seus negócios”, sinaliza o executivo.
“O WhatsApp é a rede social de mensagens instantâneas mais popular entre os brasileiros, liderando o ranking de aplicativos com mais usuários em 2023 (cerca de 169 milhões de usuários), de acordo com pesquisa realizada pela We Are Social e Meltwater”, comenta Armstrong.
“O SMS também é outro canal relevante, pois a entrega é imediata, sem necessidade de conexão com a Internet, além de ser uma ferramenta universal por chegar a todos os aparelhos celulares, não apenas smartphone”, afirma o executivo. “E a proporção de brasileiros que enviam SMS todo dia ou quase todo dia é de 8%; recebem SMS todo dia ou quase todo dia é de 44%, segundo a pesquisa ‘Mensageria no Brasil’ da Mobile Time e da Opinion Box, que foi realizada em fevereiro de 2021”, acrescenta Armstrong.
Já as ligações, comenta o executivo, “de acordo com dados da Anatel em fevereiro passado, indicam que o Brasil encerrou o mês com 250,6 milhões de linhas de celulares. Agora, para ligações mais assertivas é possível utilizar o conceito de best time to call.”
Outro ponto alto do Encontro foram as soluções apresentadas por Rodrigo Massis, head de produtos e inovação da Multiplica, que vão muito além do crédito. Segundo o executivo, “há quase 10 anos, identificamos as necessidades das empresas e estruturamos operações na medida ideal para o perfil de cada negócio. E visando construir relacionamento de longo prazo e agregar valor aos nossos clientes, criamos diversas soluções financeiras.”
O cadastro continua sendo a alma de qualquer negócio
Criar uma relação mais humanizada com o cliente na era digital não é uma tarefa fácil frente às novas tecnologias. Principalmente porque as novas gerações querem comprar tudo online, sem nenhum contato físico com o produto ou serviço. Mas no setor de crédito, “o cadastro continua sendo a alma de qualquer negócio. Se você não tem um cadastro bem feito, você não tem uma empresa duradoura. Por isso, vai se destacar quem aprendeu como o passado e tiver o básico bem feito dentro das empresas”, sinalizou Paulo Santos, head de crédito e cobrança da Eletrosom ao abrir o terceiro dia de palestras do CC Trends 2023.
Santos que comandou juntamente com Iani Engelmann, diretor da KAB, o painel: “Os 3 R’s primordiais do setor de crédito do futuro: reconstruir, reestruturar e se reconectar com o consumidor”, salientou também que “as novas tecnologias têm contribuído muito para a evolução da área de crédito, mas a gente precisa se conectar de uma forma humana com o cliente, pois a experiência do cliente hoje é que faz com que ele mude de marca por causa do atendimento.”
Iani Engelmann concorda com Santos e reforça a importância do contato com as pessoas, o olho no olho, como se fazia antigamente, na hora de conceder o crédito. Além de contar suas dores, o executivo nos fez refletir sobre como o varejo precisa se reinventar a partir da experiência do cliente, “cuja jornada precisa ser simples, intuitiva e funcional, além de segura, tendo como palavras de ordem: privacidade, integridade e garantia”.
Afinal, o novo varejo é focado no ser humano e não em produtos ou serviços. Atender às necessidades e os desejos dos consumidores, além de gerar vantagem competitiva, faz com que as empresas implementem novos modelos de negócios. .E essa reinvenção do setor varejista é urgente, principalmente diante de um cenário macroeconômico ruim, advertem os executivos.
“O Fórum Econômico Global de janeiro de 2023 realizou uma pesquisa com o grupo de economistas-chefes dos setores público e privado, dos quais, cerca de 18% consideraram uma recessão mundial ‘extremamente provável’ em 2023, mais do que o dobro da pesquisa anterior realizada em setembro de 2022”, comenta Santos.
O relatório apontou, por exemplo, em relação aos riscos globais: “alta no custo de vida em quadro de inflação global mais elevada; gravidade de confrontos geoeconômicos; investimento em tech sofrerá ajustes em 2023, buscando eficiência operacional; disseminação de crimes no mundo cibernético. Sem falar na economia desacelerada: “atividade econômica desaquecida impactará no consumo e no mercado de trabalho; a inflação continuará sendo um fator de pessimismo, além do endividamento elevado.”
Já para o mercado financeiro, o relatório sinaliza: “os efeitos de uma economia mais frágil serão sentidos de forma desigual em todo o setor bancário; bancos bem capitalizados e diversificados devem resistir razoavelmente bem às tempestades. E resiliência será a palavra de ordem: “os bancos precisarão buscar novas fontes de valor e investir nas novas tecnologias para entregar experiências personalizadas; agilidade por automação de processos, tornando-os future-ready ’ imediatamente.”
E encerrando o CC Trends 2023, André Horta, superintende de crédito, produtos e recuperação do Mercantil do Brasil e Lucas Kubiaki, diretor de canais digitais e meios de pagamento do Mercantil do Brasil apresentaram o case de sucesso do Banco que, apesar de seus 80 anos, não se intimidou frente às inovações tecnológicas no mercado financeiro.
Ao contrário, “o Mercantil busca a simplicidade para inovar ao oferecer soluções aos clientes via WhatsApp”, ressaltam os executivos. Uma estratégia que fez com que um Banco tradicional, que é referência no pagamento de benefícios do INSS, se destacasse em meio a transformação digital, principalmente no setor de crédito.
Para enriquecer ainda mais o debate, o Mastering: Consumer Credit Trends 2023 contou com a expertise e comentários, após cada palestra, de Guilherme Leonardi, data science manager da Neon.
Participe do Mastering: Consumer Credit Trends 2024. Acompanhe o calendário de Encontros da ebdi. Clique aqui.