Problemas que o próximo presidente herdará

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Por Claudio Conceição, editor-executivo da revista Conjuntura Econômica e editor-chefe do Blog da Conjuntura. Artigo – Problemas que o próximo presidente herdará

A pandemia da COVID-19, que ainda tem reflexos sobre a economia, desestruturou a atividade econômica, as cadeias de suprimento e a vida das pessoas. A desigualdade e a fome aumentaram no mundo – segundo relatório do Banco Mundial, 70 milhões de pessoas caíram na linha da pobreza em 2020, e o mundo não conseguirá erradicar a pobreza extrema em 2030, data estabelecida pela ONU. E uma guerra estourou com a invasão russa à Ucrânia, que elevou os preços das commodities, puxando a inflação mundial para cima.

Além disso, as projeções são de um menor crescimento econômico no ano que vem. A Agência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad) alerta para os riscos de uma recessão globalizada pelo aumento dos juros nos países ricos, com impactos severos sobre as nações em desenvolvimento. A agência projeta um crescimento global de 2,2% no ano que vem, com o PIB mundial ficando abaixo do período pré-pandemia até o final de 2023.

Este ano, a economia se recuperou, com o PIB crescendo acima das previsões de mercado. A taxa de desemprego caiu e, mesmo aos trancos e barrancos, nos últimos anos o país acumulou algumas reformas que podem, de fato, ter contribuído para aumentar a capacidade de crescimento da economia brasileira.

É bom lembrar, no entanto, que a demanda estava reprimida com a pandemia. Com o arrefecimento da disseminação do vírus, a vida voltou à quase normalidade, puxando para cima a atividade econômica. Isso pode ser visto pelos índices de confiança do FGV IBRE, que têm mostrado uma recuperação gradativa.

Mas a manutenção desse quadro de recuperação do PIB e do emprego vai depender da disposição do próximo presidente para fazer reformas que garantam a sustentabilidade desse crescimento sem lançar mão de medidas artificiais ou de curto prazo.

De cara, isso exigirá do presidente o desafio de conciliar a busca por mais disciplina fiscal como o meritório aumento de gastos na área da proteção social. Para isso há necessidade de um redesenho do Auxílio Brasil, com melhora de sua eficiência orçamentária, além do aprimoramento de políticas que melhorem os resultados no campo da educação e na redução da volatilidade na renda dos trabalhadores informais.

Para que esse esforço de redução da pobreza evolua – segundo dados da Rede Penssan, há 33 milhões de pessoas passando fome no Brasil –, também será necessário ações de inclusão produtiva, com melhorias no campo do mercado de trabalho.

Um dos pontos que entra nessa intrincada questão, e que tem aumentado sua importância no mundo, é a discussão de medidas de combate a diferenças de gênero no mundo do trabalho, onde o fosso salarial entre homens e mulheres aumentou com a pandemia.

Embora a taxa de desemprego tenha iniciado uma trajetória descendente nos últimos meses, ainda há muita fragilidade no mercado de trabalho, com um grande contingente de pessoas desempregadas há mais de dois anos, bem como de desalentados.

Próximo governo: desafios

Dentre tantos problemas que o próximo presidente irá herdar, a agenda fiscal será, sem dúvida, o grande desafio, já que parte da melhora observada nas contas públicas este ano, com dois anos de superávit primário, deve perder ímpeto daqui para a frente.

O desafio de manter o risco fiscal sob controle será grande, e será preciso definir prioridades. Um caminho é criar uma agenda objetiva para restabelecer a âncora fiscal do país no ritmo adequado, sinalizando a credibilidade necessária para o mercado durante esse processo, condição necessária para se atrair investimentos e impulsionar o crescimento econômico.

Se formos bem-sucedidos em fazer a lição de casa, podemos colocar o país em posição de melhor aproveitar o lado meio cheio do copo do cenário externo, que em linhas gerais não está dos mais amistosos para as economias emergentes, como apontam as análises e os Barômetros Globais do FGV IBRE que medem o pulso da economia mundial.

Os resultados mais recentes dos Barômetros sinalizam um significativo aumento da probabilidade de uma nova recessão. O aumento das taxas de juros nos Estados Unidos para conter a aceleração inflacionária ultrapassam as fronteiras do país, impactando a economia mundial como um todo, em especial os países emergentes. O cenário externo para o governo que assume em janeiro de 2023, portanto, está cheio de obstáculos.

Para se aprofundar sobre os rumos da economia para 2023, leia a Revista Conjuntura Econômica. Clique aqui.