Este artigo foi escrito por Leandro Salatti dos Santos – Managing Director da Accenture especialmente para a ebdi.
O Novo Desafio do Crédito e Cobrança no Brasil.
Há alguns anos, experimentamos um ciclo virtuoso, sustentado essencialmente pelo acesso facilitado ao crédito.
Uma grande parcela da população, até então carente dos serviços mais básicos e legitimamente desejosos de poder adquirir bens de maior valor agregado, viram este sonho se tornar realidade de uma forma muito intensa e rápida.
Chegamos muito próximos ao pleno emprego, com tarifas públicas artificial-mente controladas e transferências de renda do estado para a população mais carente, sem o devido suporte em um crescimento econômico sustentável.
O Produto Interno Bruto (PIB), oscilou por anos em índices muito próximos a zero e mesmo assim a euforia pela drástica redução no contingente de pessoas que deixaram a linha da pobreza, não nos permitiu antever o que enfrentaríamos em um novo ciclo de ajuste.
Todos sabem que o acesso facilitado a recursos financeiros através da concessão de crédito direto ao consumidor, empréstimos pessoas e financiamentos de longo prazo.
Necessita de uma educação financeira minimamente instalada e da consciência por parte do devedor, de que problemas podem vir a ocorrer ao longo do período de amortização destas dívidas.
E as dificuldades vieram
A medida que o déficit público foi crescendo, o país teve que ajustar as suas próprias contas. As tarifas públicas, até então congeladas
Passaram a crescer muito acima da capacidade financeira e da renda das pessoas e empresas. As taxas de desemprego atingiram níveis alarmantes e as famílias tiveram que fazer escolhas.
O pagamento do valor mínimo e o refinanciamento do saldo, se constituía em uma ferramenta bastante eficiente para se evitar a situação de inadimplência.
O acúmulo de dívidas e os encargos financeiros cada vez mais pesados pelo aumento do risco de inadimplência, obrigaram os órgãos reguladores a alterar as regras de refinanciamento destas dívidas.
Desde então, os bancos emissores passaram a ser mais restritivos e rigorosos com a emissão de novos cartões de crédito.
Future Pay
Um encontro digital sobre Inovação e Negócios
saiba +
Serasa Experian divulgou a existência de 63 milhões de devedores em 2019
Recentemente a Serasa Experian divulgou a existência de 63 milhões de devedores ao final do mês de março de 2019, o que equivale a um índice de 40,3% da população adulta do país, em situação de inadim-plência.
É o maior índice desde 2012 e a tendência para os próximos meses, infelizmente ainda não é animadora.
Por sua vez as empresas também tiveram que se readequar para enfrentar as dificuldades da economia e o crescimento da inadimplência.
Com mais de 12 milhões de brasileiros desempregados e custos crescentes, as ferramentas tradicionais de crédito e cobrança deixaram de ser eficientes.
Neste contexto adverso, surgiram iniciativas de substituição das comunicações impressas por mensagens eletrônicas, utilização das redes sociais como canal de acionamento, utilização de inteligência artificial
Em substituição aos serviços tradicionais de cobrança via call center, utilização de modelos estatísticos mais aprimorados para segmentação e priorização do público devedor a ser abordado, entre outras.
Grandes desafios se colocam como fundamentais para a continuidade deste processo de evolução
Todo este movimento foi bastante útil, porém ainda insuficiente, e dois grandes desafios se colocam como fundamentais para a continuidade deste processo de evolução:
O primeiro e o mais importante de todos é a necessidade dos profissionais de cobrança continuarem a buscar na inovação a solução para este novo cenário;
E o segundo, não menos desafiador é aprender a acompanhar esta necessidade de evolução sem perder a essência e a simplicidade da cobrança.
Entender este paradoxo é fundamental para que se faça o investimento correto. Transformar a forma de pensar das pessoas que lideram as áreas de Crédito e Cobrança é o primeiro passo.
De nada adianta investir em algoritmos sofisticados e em redes neurais de alta capacidade, se não soubermos onde queremos chegar.
Muitos líderes que conduzem as áreas de crédito e cobrança, foram formados a partir das suas próprias experiências práticas
Apesar de parecer algo óbvio, não se pode ignorar que muitos líderes que conduzem as áreas de crédito e cobrança,
Foram formados a partir das suas próprias experiências práticas, baseadas em processos padronizados que funcionavam muito bem em um ambiente de baixa complexidade.
Lembrem que a 15 anos, os Correios eram um exemplo de eficiência e segurança em seus processos de distribuição e entrega de correspondências.
Por si só, esta premissa validava a lógica de que a comunicação impressa seria o caminho mais eficiente e rápido para se sensibilizar o devedor e recuperar os valores envolvidos na cobrança.
As dificuldades do estado em investir e a falta de concorrência neste tipo de serviço, invalidou a premissa.
O que funcionava com excelência, não funciona mais, assim como não se pode afirmar que o e-mail e as ligações telefônicas oriundas de grandes Call Centers, têm o mesmo poder de localização e abordagem que já tiveram como ferramenta de cobrança em um passado recente.
É necessário pensar diferente…
Assim como é necessário se permitir errar e aprender com estes erros. A inovação passa por este tipo de aprendizado, o que não é uma tarefa fácil se não estivermos livres dos velhos paradigmas.
Independentemente do porte da empresa ou do grau de complexidade do mercado em que atua, vamos precisar cada vez mais de profissionais que entendam a nova dinâmica das relações de consumo e interação das pessoas.
O “devedor moderno”, se é que podemos usar esta expressão, espera que os credores tenham a capacidade de entender as suas próprias possibilidades financeiras, antes mesmo de fazer um contato de cobrança.
Cabe ao detentor do crédito, conhecer a forma como este novo devedor prefere ser contatado, que oferta pode fazer mais sentido para determinado perfil.
Com que velocidade este contato deve ser feito, que meios de pagamentos ele pode acessar com mais facilidade e assim por diante. Vivemos a era do cliente no centro da relação, sendo ele devedor ou não.
Pode parecer difícil encontrar uma solução, mas já estamos vendo soluções bastante criativas surgindo neste novo cenário.